De acordo com a Constituição de 1988: “Art. 3.º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;
IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e
quaisquer outras formas de discriminação”.
Nos termos da Lei Brasileira da Inclusão (LBI) – Lei 13.146 de 2015: “Art. 4º Toda pessoa com deficiência tem direito à igualdade de oportunidades com as demais pessoas e não sofrerá nenhuma espécie
de discriminação.
- 1° Considera-se discriminação em razão da deficiência toda forma de distinção, restrição ou exclusão, por ação ou omissão, que tenha o propósito
ou o efeito de prejudicar, impedir ou anular o reconhecimento ou exercício dos direitos e liberdades fundamentais de pessoa com deficiência, incluindo a recusa
de adaptações razoáveis e do fornecimento de tecnologias assistivas”.
As recentes declarações do ministro do trabalho de Lula, Luis Marinho, poderiam ser
tipificadas e enquadradas como crime por discriminação, por propor tratamento
diferenciado em razão da deficiência.
Ao sugerir que algumas empresas de alguns setores da economia paguem para
discriminar pessoas com deficiência, justamente, o ministro do trabalho, concorda e alinha-se com uma das principais ideias e teses das
maiores e mais representativas organizações patronais brasileiras.
O que causou maior estranheza nas palavras de Marinho, reside no fato de sua
origem política estar fincada justamente no movimento sindical cutista e ser um
dos principais aliados de Lula dentro do Partido dos Trabalhadores – PT.
Como ex dirigente e militante do movimento sindical progressista, o ministro do
trabalho de Lula, sabe muito bem o quão as empresas brasileiras são resistentes
e profundamente atrasadas, quando o assunto envolve o trabalho das pessoas com
deficiência.
Desde quando a proposta do ex Deputado Federal Cesar Maia, sugerindo a reserva de vagas no trabalho para pessoas com deficiência foi apresentada
ainda durante a Assembleia Nacional Constituinte, dentro do parlamento, os
principais representantes das organizações patronais do país, já criticavam a
proposição, utilizando-se praticamente dos mesmos argumentos de Luis Marinho.
Quando a Lei 8.213 de 1991 foi publicada, ela poderia e deveria ter sido
aplicada imediatamente. Porém, utilizando-se do argumento da necessidade da
regulamentação, as organizações patronais conseguiram protelar o início da
aplicação do previsto no Artigo 94 da Lei 8.213 de 1991, até 1999, com a
edição do Decreto Federal 3.298 de 1999.
Mesmo com a publicação do referido Decreto e outros vários instrumentos
jurídicos editados pelo Ministério do Trabalho, pelo Ministério Público do
Trabalho e outros órgãos governamentais responsáveis pela implementação das
garantias ao trabalho para as pessoas com deficiência, mesmo assim, a grande
maioria das empresas brasileiras, continuavam e continuam mostrando o quão são
preconceituosas e capacitistas , quanto ao cumprimento das garantias
constitucionais sobre o direito ao trabalho deste segmento social
historicamente marginalizado e profundamente discriminado.
O ministro do trabalho de Lula nega sua origem ao dizer que está absolutamente convencido
de que é necessário ouvir e acatar os argumentos de alguns empresários que
ainda hoje continuam com o falacioso discurso da falta de qualificação das
pessoas com deficiência. Nega justamente porque garante vez e voz aos
empresários, mas não diz nada sobre a necessidade de garantir o mesmo direito
de voz evez às organizações representativas das pessoas com deficiência, aos
próprios técnicos do Ministério do Trabalho, responsáveis pela fiscalização
nas empresas no que tange ao cumprimento do direito ao trabalho das pessoas
com deficiência, sobre a necessidade de ouvir o Ministério Público do
Trabalho, o Conselho Nacional de Defesa dos Direitos das Pessoas com
Deficiência – CONADE, a Secretaria Nacional dos Direitos das Pessoas com
Deficiência, do Ministério dos Direitos Humanos, entre tantas outras
organizações que lutam diariamente e incansavelmente, contra empresas e
empresários que preferem pagar para não ter pessoas com deficiência dentro das
suas organizações e corporações empresariais.
Se do ponto de vista pessoal Marinho pensa como os empresários que ele
mesmo cita na sua fala, não tenho nenhuma objeção porque ele está no seu
direito de opinião e manifestação, garantido pela Constituição de 1988.
O problema e mais grave é que Luis Marinho falou como Ministro do Trabalho do
governo Lula. E nesta condição suas palavras precisam ser profundamente
condenadas. Elas foram infelizes e impróprias, porque reforçam e fortalecem os
falsos e falaciosos argumentos preconceituosos (capacitistas) de algumas
empresas e empresários que ainda hoje conduzem seus empreendimentos
lucrativos, sem nenhuma preocupação com a inclusão social das pessoas com
deficiência.
Ênio Rodrigues é Diretor do Instituto Paranaense de Cegos e colaborador do site do CNCLP.