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Muitos que me conhecem, ao ler o título, devem ter respondido “na lata”: ele vai discorrer que sim!

 

Pois bem, só posso pensar que por um modismo, ou mais um modismo das redes sociais, está se aventando que devemos dizer agora que temos orgulho de sermos cegos. O “orgulho cego” deverá ser difundido logo mais por todo lugar e é bem capaz do termo pegar, assim como por todo lugar se ouve PCD pra cá, PCD pra lá e inclusive se tem PCD’s por todo canto hoje em dia! Parece que é outra moda ser PCD. Todo mundo quer ser um PCD, mas claro, um PCD bem levinho, tipo uma tendinite já está bom demais! O que vale é ter os benefícios que o famoso PCD tem.

 

E agora entrando no termo “orgulho cego” de fato, eu não tenho nenhum orgulho em ser cego. Pronto, falei! Tenho sim muito orgulho de chegar onde cheguei, de ter o que tenho e de ser o que sou, porém, nada disso foi por conta da minha cegueira. Tudo que conquistei até hoje foi por minha força de vontade, minha garra de vencer, minhas noites de sono mal dormidas para estudar e ir bem nas minhas provas e me formar naquilo que queria. Tudo que conquistei na vida foi com muita luta e determinação e tenho certeza de que teria também se enxergasse, apenas seria um pouco mais fácil, apenas talvez no caminho tivessem um pouco menos de espinhos do que tive que enfrentar, porque todo cego sabe o quanto nós temos que nos desdobrar para chegar onde queremos. Mas isso nunca deve ser desculpa para não conseguirmos fazer o que desejamos, para ser o que quisermos ser nesta vida.

 

Também entendo aquele que acha que deve ter orgulho por ser cego. Não tenho nada contra quem tem esse pensamento. Só acho que o termo não deve ser imposto ao seguimento de pessoas cegas ou com baixa visão, simplesmente copiado de outros movimentos, como disse acima, indo por um caminho fácil do modismo que não permite que reflitamos, somente sigamos o que alguém disse. Isso é ser “pau-mandado”, ou mais usado atualmente, ser gado.

 

É mais claro que água límpida que não tenho nenhuma vergonha de ser cego! Mas daí a ter orgulho disso, vai uma distância muito grande. Nós cegos somos o que somos e não pode ser a cegueira que vai determinar se serei bem-sucedido ou não; não pode ser a cegueira que vai me limitar nas minhas conquistas e nos meus feitos; não pode ser a cegueira que vai determinar o meu destino. Quem faz o nosso destino somos nós. Nada está determinado, tudo deve ser construído e nós somos responsáveis por construir; nós somos arquitetos do nosso futuro, independente de termos deficiência ou não, seja qual for o grau dessa limitação visual.

 

Antes que alguém venha me dizer: “tá vendo? Por isso que o movimento dos cegos nunca consegue nada! Nós somos muito desunidos!”

Também vou precisar discordar disso. Eu nunca vi algum movimento, agrupamento, coletividade ou seguimento, seja ele social, político ou religioso que não tenha discordância.

 

Nós cegos, como todos os seres humanos, divergimos daquilo que não concordamos. E acho que isso é muito natural, pois se não há discordância não há crescimento, não há evolução. Tendemos a achar que somos desunidos porque participamos especificamente desse movimento ou desse agrupamento em questão. Se participarmos do movimento dos pretos contra o racismo, do movimento do grupo LGBTQIAPN+ contra homofobia ou de qualquer outro tipo de movimento de minorias sociais, vamos perceber que em todos eles existem opiniões contrárias às decisões a se tomar dentro do grupo.

 

Tivemos nesta semana discordância até no grupo dos direitistas! Quem diria que a boiada se dispersaria chifrando uns aos outros? Por fim, só para concluir, podemos dizer que se até os bolsonaristas estão discordando entre si, por que nós cegos pensantes e com uma massa encefálica um tanto mais cinza não discordaríamos entre nós?

 

 

Marcos Ricieri é Analista de Sistemas e Editor no site CNCLP